Há um mecanismo mau e misterioso que tento compreender. Às vezes acontece-nos uma coisa má, de cuja gravidade emocional nem sempre nos apercebemos logo no momento em que acontece. É uma coisa má do tipo dar-nos vontade de esquecer. E sempre que nos lembramos temos o desejo de voltar atrás no tempo para corrigir ou evitar essa coisa. Tipicamente, dá vontade de não nos lembrarmos. Por vezes, essa coisa má foi culpa nossa, ou foi uma má jogada da nossa parte. Tem quase sempre a ver com qualquer oportunidade mal aproveitada ou com qualquer coisa como perder a face num plano emocional. Sentimo-nos envorgonhados sozinhos.
Enquanto essa coisa não for resolvida, enquanto não voltarmos atrás no tempo e não arranjarmos tudo de uma maneira diferente e boa, não avançamos em nada. Procrastinamos em tudo. Não se sabe bem o que é que foi, o que é que ficou mal, ou sabe-se apenas em qual situação, em que dia ou com que pessoa é que a coisa, a “causa” ocorreu mas não se sabe o nexo, o detalhe, o ponto bicudo que nos magoou. E enquanto magoar lá no fundo, por baixo de almofadas e mais almofadas emocionais, são rotas mas pomos muitas umas por cima das outras, enquanto a coisa estiver lá em baixo e nós olharmos para cima, é o trabalho que não avança, a decisão importante que se hesita, o curso ou mestrado que nunca mais se acaba, a rotina em que se permanece, os horizontes para os quais se avança de lado sem querer mesmo avançar.
É como um castigo ou talvez melhor um incentivo doloroso auto-imposto: enquanto não resolver o que não sei ao certo e que ficou no passado irreversível (talvez), comprometo-me dolorosamente perante mim mesmo a não avançar em nada. Se avançar tendo “aquilo” por resolver, então nunca mais o resolverei. Portanto, para não me esquecer do que está no passado, não avanço. E por outro lado, se “aquilo” não ficou resolvido, de que adianta avançar?, que sentido tem avançar? É que “aquilo” é que era importante, só “aquilo” era verdadeiramente importante. Só a EMOÇÃO é importante.
Mas o que foi afinal ao certo “aquilo” de que não me lembro e não compreendo e sobre o qual não terei provavelmente poder nenhum???...
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