Assim era conhecido o padre Joaquim Machado Rebelo, nascido em 1834 e de signo Pisciano.
A primeira vez que tive o prazer de ouvir o seu nome, foi em Braga, a deliciar-me com o seu célebre pudim, depois de me ter regalado antes com outros manjares.
O nosso abade era um homem multifacetado: um amador dramático, fotógrafo, desenvolvendo projectos para catequese baseados no que viria a ser a imagem animada, engomando a roupa na perfeição, costureiro , perito na agulha e um bordador melhor que qualquer freira.
Um homem perfeito, mas que ficou conhecido sobretudo como um dos melhores cozinheiros portugueses, Organizou e cozinhou jantares para reis, príncipes, prelados, aristocratas, gente da política ,da arte e das letras , la crème de la crème.
Interessava-lhe não só a confecção dos alimentos mas também a sua apresentação: era um perfeccionista, pois era. Conhecida foi a misteriosa maleta que o acompanhava, cheia de misteriosos frasquinhos. Contam que um dia, deixou chegar o bispo (esturrar) a um cozinhado que ia servir exactamente a um Bispo. Logo pegou numa dessas mezinhas e tirou o bispo do cozinhado por completo. Quem me dera ter esse frasquinho!
Adorava fazer confeitaria fina e ficaram conhecidos os seus enfeites de açúcar, a que acrescentava cambraias, sedas e veludos.Amigo de João da Mata, outro célebre cozinheiro, fizeram muitos almoços e patuscadas juntos.
Uma vez pediram-lhe as receitas escritas e ele assim respondeu" É impossivel de lhe dar com as receitas os dedos das minhas mãos e o meu paladar. A Culinária é uma arte muito bela, mas depende inteiramente de quem a pratica".
Mesmo assim, aqui se regista a célebre receita do Pudim de toucinho, simples mas que depende da perícia da mão e do paladar do obreiro:
Deita-se num tacho de latão ou cobre meio litro de água e logo que esta ferva, 500 gramas de açúcar pilé, casca de limão, canela em pau, e 50 gramas da gordura de bom presunto de Chaves ou Melgaço. Separam-se das claras quinze gemas de ovos e batem-se estas muito bem..Junta-se-lhe um cálice de vinho do porto e bate-se tudo novamente. Quando o conteúdo do tacho estiver em meio ponto, passa-se a calda por um coador de rede muito fina e misturam-se-lhe as gemas de ovos. Barra-se uma forma , interiormente e com a maior minúcia, de açúcar queimado. Deita-se a preparação na forma , tapa-se cuiodadosamente e põe-se a cozer em banho maria. Passados 30 minutos, está pronto o pudim.
Experimentem.Depois contem o resultado!
Outras história do nosso abade são recordados: de como em viagem por França, se precaviu com bacalhau, informado que foi que aí não o usavam e deslumbrando os franceses com as suas receitas do fiel amigo.
Dos opíparos jantares que serviu a D. Luís e de como encantou a então Princesa Dona Amélia com os palitos de Lorvão, que ele próprio elaborou e que os padrões de tão complexos que eram, nunca mais ninguém quis repetir.
Um esteta, um perfeccionista . Um homem que nos faz falta, e que continua vivo pelo legado que nos deixou.
Post inspirado num artigo de Francisco Lage sobre o Abade de Priscos,
Revista Panorama, 1956
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