«Um Beckett sertanejo
que traz a inexorabilidade de nosso fim, mas com diversão e picardia» (Newton
Moreno)
Zaninha e Socorro são duas
carpideiras centenárias do interior do nordeste brasileiro que entoam incelências
(cânticos em virtude dos falecidos) e choram a morte dos outros, ajudando-os a
“passar para o outro lado”.
Nestas suas viagens pelo sertão brasileiro vão
criando uma ligação única, que as converte numa dupla muito especial. No
entanto, e paradoxalmente, estas duas “antigas” mulheres temem a morte e vão
fazer tudo o que estiver ao seu alcance para dela escapar.
“As centenárias”, espetáculo com
encenação de Natália Luiza e interpretação de Catarina Guerreiro, Flávia Gusmão
e Sílvia Filipe poderá ser visto até dia 10 de Novembro no
Teatro Meridional.
O espaço onde se desenvolve a
ação é quase sonhado, onírico, meio sombrio e incerto; mas que ao mesmo tempo,
com o desenrolar da história se vai transformando em “todos os lugares”.
"As Centenárias"-Fotografia Nuno Figueira |
De acordo com Natália Luiza, o
mote para a escolha desta peça de Newton Moreno foi, não só a oportunidade de
trazer a palco um português cuja musicalidade homenageia a nossa língua e nos
leva a outros lugares; mas também a necessidade de contar uma história que nos
ponha em confronto com a morte, condição a que todos igualmente estamos
sujeitos.
O sotaque do nordeste dá uma
dimensão enternecedora, mas também divertida às personagens, já que para
Natália Luiza: “fazê-lo de outro modo seria escrever outro texto”.
As carpideiras personificam-nos,
simbolizam a nossa dificuldade de enfrentar a condição finita que nos assiste:
ainda que o “nada” atemorize é também ele que nos define.
Estas personagens levam à reflexão inevitável
sobre a necessidade do choro e do luto, num mundo onde se reprimem as emoções e
tudo acontece a uma velocidade desarmante.
"As Centenárias- imagem de Nuno Figueira" |
Deparamo-nos com uma história
fechada, que contraria de forma assumida as narrativas fragmentadas e de livre
interpretação.
Este espetáculo compromete-se, estrutura-nos,
dá-nos referências e princípios muito claros, sem por isso nos tirar a
individualidade.
De forma subtil vamo-nos
questionando sobre a efemeridade da vida, o luto, o silêncio e a forma como a
amizade – personificada através de Zaninha e Socorro – pode ter um papel
estruturante e fazer a diferença enquanto nos vamos escapando da morte.
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