15 de novembro de 2017

"Nas asas da Saudade"


Havia tempos o Mauro Di Deus não me ligava. De repente, uma mensagem na tela do celular: "Maranhão, acabei de receber isto e pensei imediatamente em você". Abri correndo. Era um convite, ao mesmo tempo carinhoso e comovente.

Carinhoso porque permitia aos amigos mais próximos o privilégio de chegar primeiro ao prédio onde funcionou o "Mercado Municipal de Brasília", na 509 da W3 Sul, desde que foi aberto, até o último dia em que deixou de funcionar.

Comovente porque comunicava a venda de centenas de peças garimpadas ao longo de anos, por Jorge Ferreira - dono e criador do Mercado. A decisão da família era um exercício de desprendimento amoroso. Depois que Jorge faleceu, não havia como guardar tantas peças. E o melhor, no entender deles, era deixar que cada amigo, cada frequentador, levasse consigo uma lembrança daquele lugar tão marcante da cena cultural de Brasília.

O mercado
Lembrar que o mercado fechou depois da morte do Jorge fez doer um fiozinho de melancolia no peito. De imediato, liguei pro Mauro e perguntei sobre a possibilidade de fazer um registro daquela "despedida". Ele me passou o contato do Lucas, filho do Jorge, com quem travei uma conversa emocionada.

Jorge e seu sorriso
Combinada a autorização pra filmar, fui atrás de equipe e equipamento. E percebi logo o grau de dificuldade. Meus parceiros mais comuns de filmagem não puderam me acompanhar nessa jornada. Descubro que Abdon e sua produtora "Canto Cerrado" também sucumbiram à crise brasileira. A produtora fechou. Foi mais um baque. Mais uma notícia triste.

Depois de várias tentativas, já tarde da noite, me dei por vencido. Não ia conseguir mesmo fazer o registro que achava necessário. A noite veio como um alento. O sono, um hiato necessário entre a angústia e a resignação.

Acordo na manhã de sábado, com previsão de um plantão na TV, a partir do meio-dia. Olho outra vez para o telefone e decido: Vou filmar, mesmo que seja com a câmera do telemóvel. E parto para o Mercado. O restante... Bem, o restante está ai embaixo, no filme de quatro minutos, montado, editado e trilhado também no i-movie.

Algo que me deu muito orgulho de ter conseguido fazer. Pela memória do Jorge. Pela saudade do Mercado. Por tudo o que eles - Jorge e Mercado - significam para Brasília.

   


12 de agosto de 2017

13 de maio de 2017

Mar de saudade, barco imaginário

Um barco imaginário, a Baía de São Marcos,
memórias do Bela Rosa e de meu avô, Opílio.  

Acordei pensando em meu avô, Opílio.
Desde antes, venho pensando nele. Há dias.
Sei, não faz muito sentido. É véspera do dia das mães, não dos avôs.
Mas, que importa? O pensamento é livre. Penso nele e pronto.

Meu avô era dono de barco. Um barco que só imaginei, a partir do que me contaram. Não tive idade pra ver o mar da baía de São Marcos bater provocante em seu casco. Nem pra sentir o vento de proa soprar no rosto dos barqueiros que se metem a enfrentar o mar aberto. Cantiga de marinheiro, poema de maresia. 

Mas as histórias dele, o Bela Rosa, as poucas que ouvi, me são suficientes para fazê-lo um barco encantado. Foi por um tempo desejo, diversão e ganha-pão do "seu" Opílio. Um barco de aventuras comerciais. Meu avô tinha um pequeno grupo de marinheiros comandado pelo irmão dele, Gregório Viegas. 

A cada travessia trazia coisas do interior. Do continente para a ilha de São Luis.
Vinha de Alcântara, onde meu avô nasceu e se criou. Horas depois de vencer o banzeiro, aportava na Praia Grande ou no I'Bacanga. Portos de desembarque, cheiro de peixe, de frutas, de comida da terra. Gritaria colorida, fuzarca de gente simples, idas e vindas constantes que faziam as segundas parecerem domingos de festa. 

Até um dia em que a notícia chegou primeiro que a carga, primeiro que o barco: Uma rajada de vento quebrara o mastro, deixando a nau à deriva, em alto mar.
Opílio sempre foi um homem prático. Se o mar quer levá-lo, é porque não é mais meu. Mas o convenceram a resgatar. Corda, reboque da marinha, lá se foram mar à dentro, sob o olhar atento de Gregório, o capitão. 

Meu pai é quem me conta. Avistaram o barco depois de horas de navegação. Mas o reboque não tinha como chegar tão perto. Gregório amarrou uma corda na cintura e pulou no mar. Nadou contra a corrente até alcançar o Bela Rosa. 

Rebocado, mastro quebrado, parado na Praia Grande sob o olhar de meu avô e seus marinheiros. Foi como uma despedida. Meu avô vendeu o que restou do Bela Rosa ao primeiro que lhe fez uma oferta. 

Imagino meu avô caminhando de volta para a Madre Deus. Alpercatas de couro, calça de linho branco, camisa aberta à altura do peito, cabelo cuidadosamente alinhado, o galego aventureiro ganha a rua de São Pantaleão, entra na Rui Barbosa pensando na próxima investida. Antes de chegar em casa, passa na banca de "seu" Sanclaire. Aposta uns trocados no Galo. E espera pacientemente o fim do dia, quando viria buscar o produto de sua "fé". 

Meu avô nunca perdeu uma aposta.



O "velho Lobo do Mar", Opílio Viegas, comigo.
Priscas eras.  Saudade. 

31 de março de 2017

Um papel

Foi há quase 28 anos. Alguém visitou um preso, levou-lhe 1 rádio, pilhas, fruta, fiambre, chouriço, lâminas de barbear, uma palavra que não decifro e fotografias. Outro alguém deixou este papelito dentro de um livro e veio ter a mim, para eu vos contar esta história.

16 de março de 2017

O meu rico Santo António

Não resisto a este Santo António...Uma capa dum fascículo do Rocha Martins e da autoria de Alberto de Sousa.

12 de março de 2017

Cartas à Constituinte - Trinta anos depois

Ulysses Guimarães caminha sobre a rampa do Congresso.
Quando fevereiro começou, lembrei da data: Trinta anos de instalação da Assembleia Nacional Constituinte. E lembrei, também, que dez anos antes, quando estava na TV Senado, dei uma pequena contribuição na produção de um material sobre as "Cartas que foram escritas à Constituinte". 

Ulysses e a "Constituição Cidadã"
Foi dai que surgiu a ideia de tentar identificar pessoas que viviam no Distrito Federal, à época, e que tivessem também mandado sugestões à Constituinte. Foi um trabalho de garimpagem. Localizei 50 cartas (há mais, mas parei por ai). Já tinha um número que julgava suficiente para o trabalho e, com um pouco de sorte, localizaria entre essas cartas garimpadas alguém para relembrar a história. O desafio seguinte foi pedir à produção que tentasse encontrar alguém que ainda estivesse por aqui. Um trabalho tocado com maestria e persistência pelo amigo Oussama El Ghaouri Filho.  



Um a um os endereços originais foram verificados. Das cinquenta cartas, nove autores foram localizados. Destes nove, apenas dois toparam participar da "crônica de sexta". Foi uma vitória. Ver uma ideia que nasceu despretensiosa tomar forma, sair do papel e virar realidade. Para ajudar a contar uma história de um Brasil dos sonhos, nestes tempos em que mais comuns são os pesadelos. Eles não sabiam, mas nós levamos uma reprodução em cores das cartas originais. Por isso, a emoção do reencontro é absolutamente original. 

Suely Martins e Maranhão Viegas
Compartilho com vocês o resultado do trabalho levado ao ar ontem, sexta-feira, 10/03, no Repórter DF - telejornal pelo qual estou responsável - e, em rede nacional, pelo Repórter Brasil. 


Este material tem significado especial, também, porque  marca o meu reencontro com o lado da frente das câmeras - coisa que não acontecia havia pelo menos vinte anos. 



15 de fevereiro de 2017