26 de março de 2010

o teatro gil vicente de barcelos vai reabrir as portas vinte anos depois

embora apenas para uma visita guiada às obras inacabadas

se, por hipotética hipótese, eu partir o braço da estátua da dona maria no palácio de queluz, vou preso por atentado ao património.
se um autarca destruir por completo uma obra para no mesmo local construir outra com a mesma finalidade está ao abrigo de alguma 'isenção de crime de atentado ao património'?
ou é apenas inimputável?
no começo dos anos 90, com o teatro gil vicente já fechado, os seus proprietários proposeram à cãmara municipal de barcelos a sua compra.
a autarquia, gerida pelo vice-rei de barcelos, dr. fernando reis, considerou que não tinha dinheiro para a compra, o que levou os proprietários a venderam o teatro a uma empresa, especializada em obras públicas, por 60 000 000$00.
5 anos depois, o vice rei de barcelos delibera a compra do teatro a essa mesma empresa por... 150 000 000$00.
para os empreiteiros, negociar com a autarquia de barcelos sempre foi um negócio muito rentável.
mas finalmente o teatro estava na mãos da autarquia que lançou um concurso de ideias para a sua recuperação.
das várias propostas apresentadas, uma delas da autoria do arquitecto oliveira dias, propunha a recuperação do traçado original da sala e palco (com muitos elementos arte nova e uma construção clássica de teatro italiano do século 19), dando-lhe funcionalidade, e a reconstrução das zonas 'sociais' e de apoio com um traço mais moderno. a fachada seria, obviamente recuperada.
mas o vice rei de barcelos queria uma obra que pudesse dizer que era 'dele' e aceitou como boa a proposta que destruía por completo o teatro existente e construía um novo, reduzindo o número de lugares na sala principal.
os empreiteiros agradecem sempre estas decisões...
a nova sala, com 300 lugares, vai impedir que se realizem espectáculos com artistas ou grupos (sejam de que natureza forem) que por via do seu custo de produção e/ou cachet obriguem a um número maior de espectadores para o custearem..
as soluções são simples: 1) não se programam; 2) a câmara subsidia; 3) os bilhetes são a preço de ourivesaria.
qualquer das soluções é excelente, como calculam.
a minha dúvida, não tendo nada contra espaços múltiplos com uma sala pequena e um café concerto (provavelmente para fazer o mesmo trabalho que durante alguns anos fez o museu da olaria com os seus chás das quintas e os concertos que organizou, ou o auditório da biblioteca municipal, cada um deles a uns 300 metros do teatro), tem a ver com esta simples questão:
se era para fazer um teatro novo porque não fizeram simplesmente isso:
um teatro novo, num local novo, sem terem que destruir aquele que já existia...
eu sei que os processos cognitivos dos autarcas são, geralmente, mistérios inexplicáveis, mas se querem fazer novo para o brilho e para a glória, porque não fazem novo?????
talvez a razão seja mesmo o crime contra o património não abranger autarcas...
espero que, ao menos, as conversações com paulo brandão cheguem a bom porto e barcelos tenha o melhor programador do minho e arredores.
o trabalho que deixou feito na casa das artes em famalicão e no teatro circo em braga, antecipam uma excelente programação... para 300 pessoas

3 comentários:

Anónimo disse...

Ou como isto entronca no meu comentário de ontem ao "Por Lisboa fora"...
O Teatro Rosa Damasceno, magnífico exemplar da arquitectura modernista em Santarém, sob projecto do Arq Amilcar Pinto, também passou por um processo com muitas semelhanças ao descrito, pois nele também intervieram o proprietário inicial, autarquia, empresa de construção civil como proprietário final, autarquia de novo, tribunais, etc., até que em 10 de Março de 2007 cumpriu o seu destino: ardeu! Como diz o povo, morto o bicho acabou-se a peçonha.

CMD

Anónimo disse...

Caro(a) Bloguer, depois de ler o seu post, permita-me, que lhe diga, concordo em parte com o que escreveu. Sem duvida, Barcelos hà muito que necessita de um espaço cultural com, condições técnicas para realização de espectáculos. Infelizmente, este teatro não vai trazer grandes alternativas a Barcelos. Queria também informar que o teatro não tem os 300 lugares mas sim 196, o mais interessante é que a plateia tem 190 e existe um camarote de 6 lugares, este camarote deixa-me adivinhar que, seria para o “REI” e sua comitiva, mas felizmente saiu o tiro pela culatra como se diz na gíria. Esta situação agrava ainda mais as suas previsões.
Quero também fazer um reparo ao seu ultimo comentário, é certo e inquestionável que o sr. Paulo Brandão é um grande manager cultural mas não é nenhum “Zé Mourinho” e quando diz que fez um bom trabalho em Famalicão tem toda a razão, mas por certo já não poderá dizer o mesmo, quanto ao teatro circo. O Buraco financeiro com a programação, uma programação que não vai ao encontro dos “gostos” de grande parte da sociedade bracarense, uma sociedade outrora com grandes costumes e tradições no teatro e na revista, quando na reabertura a programação era direccionada a uma minoria elitista da cidade. E ainda por cima a produção teatral resume-se à Companhia de Teatro de Braga que muito sinceramente não sei como este pais e o ministério da cultura ainda os apoia! Agora apraz-me dizer, Aida bem que o Paulo Brandão não vem para o teatro Gil Vicente! Barcelos e a maior parte dos cidadão barcelenses, nem sequer sonham a real capacidade artística e cultural que o conselho dispõe. Com uma cultura maioritariamente popular, Barcelos é agora e sempre foi auto suficiente, do ponto de vista cultural. Temos grandes exemplos, Academia de Musica de Barcelos, A Capoeira – Companhia de teatro de Barcelos e nomes de artistas barcelenses, desde a musica ao teatro passando pela bailado e dança contemporânea. Barcelos não precisa de forasteiros, precisa sim de um povo dinâmico e corajoso e acima de tudo, que não se limite a dizer mal do que, por cá se faz!!!! Por toda a parte levo Barcelos no coração!
Passe bem! Boa noite.

Rodriguez Ferreiro.
Artistic Manager and Cultural
New theatre Oxford. UK

Se fizer questão de me contactar: ogait_tm@yahoo.com.br

carlos disse...

caro rodriguez ferreiro,

tem razão nas suas precisões sobre a capacidade do 'novo' teatro gil vicente.
os 300 lugares constavam do plano inicial de 'reconstrução' do teatro e foram durante muito tempo a bandeira (pequena, mas bandeira) da autarquia.
mas na prática o que veio a acontecer foi que a lotação ficou reduzida aos míseros 190+6.
tal como o anunciado 'café-concerto', não é mais que o normalíssimo bar do teatro, onde, com o afastamento de algumas mesas e cadeiras, alguém poderá fazer alguma performance, se tiver cuidado a não pisar os 'espectadores'.
mesmo a 'anunciada' inauguração foi sendo adiada sucessivamente porque os materiais utilizados estavam a léguas dos que constavam do contrato (afinal muita gente estaria á espera que o reinado dos reis se prolongasse no tempo), para além de algumas 'curiosidades' práticas ao estilo dos camarins numa espécie de terceiro andar sem elevador, o que é útil em qualquer espectáculo onde seja necessário mudar de roupa a meio... ou seja, a actual vereação recusa-se a receber o teatro tal como o vencedor do concurso o deu por concluído.
quanto à programação, falo do caso do paulo brandão pela minha experiência enquanto espectador.
quer o seu percurso na casa das artes, quer no teatro circo foram, para mim, de excelente qualidade e, nos casos onde estive presente, com bastante boa afluência de público (alguns com ar de esgotados).
já aqui falei em tempos, a propósito do concerto das unthanks em sintra, que o preço dos bilhetes na zona de lisboa e no minho é absolutamente díspar.
a presença da companhia de teatro de braga no circo, nunca me pareceu que fosse uma coisa que muito agradasse ao seu programador, coisa uma bocado surrealista...
por norma, os preços dos concertos no teatro circo (como no vila flor) são entre os 8 e os 10 euros, quando exactamente os mesmos espectáculos, por exemplo no olga cadaval, custam 20 euros.
seguramente o dinheiro tem que sair dos orçamentos... por mesmo a casa cheia não paga as despesas. e quanto mais espectáculos, mais dinheiro sai dos orçamentos.
é para mim indiferente que seja o paulo brandão ou outro qualquer. falei dele porque dele conheço o trabalho.
mas, também por conhecer o trabalho, seguramente preferia que fosse a equipa do amimuola com a ajuda da zoom (nalguns casos os elementos cruzam-se), que já provaram que conseguem realizar épocas sucessivas de programação com custos bastante reduzidos (as temporadas dos chás das quintas) e de muita qualidade e variedade de estilos e gostos.

tem razão em mais uma coisa, caro rodriguez: existe uma coisa estranha em barcelos, que é uma grande capacidade de não valorizar o que têm.
eu estive dois anos em barcelos.
lisboeta dos 4 costados (com mais alguns costados em fajão), barcelos foi uma surpresa muitíssimo agradável e onde deixei muitos amigos e muitas saudades.
barcelos tem uma enorme vitalidade no teatro popular centrado nas colectividades; tem um naipe de músicos (high flying bird, partizan seed, la la la ressonance, godog...) tão variados como excelentes; tem sim a academia de música que precisa seguramente de espaços para afirmar os seus músicos...
barcelos, ao contrário do que a maioria dos seus naturais com quem falava, tem uma actividade cultural muito rica: apenas precisa de espaço e oportunidade para se mostrar.
espero, sinceramente, que quando regressar a barcelos, o teatro já esteja a funcionar e com uma programação à altura dos barcelenses.

um abraço, e obrigado

carlos