17 de abril de 2009

Memórias de Abril

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Álvaro, hoje editor adjunto da Fotografia do DN, era repórter no República, o único, por sinal. José trabalhava para o Diário de Lisboa. Naquele dia, cruzaram-se na marginal, perto da Cruz Quebrada, às sete e meia da manhã. Circulavam em sentido contrário e foi José que deu a notícia ao irmão: “Houve um golpe de Estado!” Combinaram logo ali a táctica: cada um ia por seu lado e, no final, distribuiriam material pelos dois jornais. Assim foi.
“Foi um dia de muita confusão”, recorda Álvaro Tavares. Aliás, foram dias. “Não se dormia. Comia-se mal e à pressa. Durante dois ou três dias, não fui a casa”. No dia 25, Álvaro e José reencontraram-se no Largo do Carmo, o entreposto decisivo do golpe de Estado. Foi aí que mais se fotografou. E foi aí que observaram uma figura central, Salgueiro Maia.
Álvaro lembra-se de uma história curiosa: “Ao fim da tarde, Salgueiro Maia estava a conversar com o jornalista e, a certa altura, foi interpelado pelo seu condutor”:
- Meu capitão, não tenho gasolina no jipe.
- Vai a uma bomba e atesta.
- Mas eu não tenho dinheiro, meu capitão.
- Não é preciso. Vai a uma bomba, diz que ela foi nacionalizada e atesta.
Que melhor prova revolucionária?...
No meio da confusão daqueles dias, Álvaro Tavares foi procurado por um responsável da revista brasileira Manchete, que queria fotografias do 25 de Abril. Mostrou-lhe algumas. Um silêncio demorado foi quebrado por uma pergunta: “Cara, isto são mesmo fotos da Revolução?” Álvaro estranhou a pergunta e lançou um: “Porquê?” Resposta pronta: “É que eu nunca vi fotografias de revoluções focadas…” É. As fotografias de Álvaro e de José Tavares revelam um cuidado, uma serenidade espantosa para quem estava a viver momentos tão quentes. Havia também alguma economia de meios. Os laboratórios eram muito artesanais e os rolos às vezes eram pagos pelos próprios fotógrafos. Por isso, diz Álvaro Tavares: “Tínhamos de ser muito selectivos, não fotografar à toa.”
In Suplemento do Diário de Notícias, 25 de Abril de 1999

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