Não se trata - de momento - de um livro da infância ou juventude, consistindo simplesmente num manual de instruções para quem lida com crianças e jovens, ligados ou não por laços de parentesco ou de profissão. Trata-se de um simples livrinho, sem pretensões, importante para que possamos trazer um pequeno contributo para um mundo com um pouco mais de aconchego... e assim todos ficaremos a ganhar.
Os alunos já tinham saído todos, menos o António. Com uma expressão de pavor no olhar, aproximou-se de mim que ainda estava junto da secretária, e balbuciou mais ou menos isto:
- Já viu isto? Eu quero mexer as mãos, e mexo esta mão. E agora este dedo, e ele mexe-se… Eu quero andar e logo as minhas pernas começam a mover-se, tal e qual para onde eu quero ir! (…) e as palavras que eu estou agora a dizer estão a sair da minha boca, e eu oiço-as, e sei o que elas querem dizer… e isto é horrível! O que é que me está a acontecer?
Confesso que fiquei também eu profundamente inquieta e comovida. Olhei para ele, e como se tivesse acabado de ouvir a coisa mais natural deste mundo, respondi-lhe:
- Mas isso não é nada horrível, António! Isso é uma verdadeira maravilha. És tu que estás a ter consciência de ti próprio, do que sempre fizeste mecanicamente, inconscientemente, ou sem pensar: mexer um dedo, andar, falar. Não te aflijas, porque isso é pura poesia. (…) porque é que não escreves isso mesmo que te está a acontecer(…) Escreve tudo o que acabas de descobrir agora! Então, no dia seguinte, ele trouxe-me um texto que é todo o seu espanto de existir.
Um dia olhei-me ao espelho
E perguntei a mim mesmo:
Como consigo eu falar
Juntar as palavras e fazer frases?
Ainda um dia gostaria de saber
Como tudo isto é feito
Também penso
Como me equilibro
Nas pernas
E corro
Ando
Faço exercícios.
Como será este mundo maravilhoso?
Como será este mundo misterioso?
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