6 de março de 2009

Quem escreveu? - Parte II

Ontem transcrevi uma crónica de jornal e acreditei que - mesmo com recurso ao Google - conseguissem encontrar a sua autoria(copiei o texto de um livro daquela famosa colecção forma, da Editorial Presença, que publicou , entre tantos outros, Brecht, Maiakowski, Cesariny...)
Tendo estranhado a ausência de "pontaria" (não levem a mal, mas foi: "cada tiro, cada melro") , gostaria de tecer algumas divagações (tentando, no entanto, ser disciplinada), por acreditar que, deste modo, chegarão mais facilmente à resposta.
1)- o autor da crónica, homem com uma vida breve, foi responsável por textos poéticos marcantes e com notórios sentimentos de desenraizamento da terra-mãe (tema que me toca particularmente);
2)- um deles, mesmo não sendo o mais importante (opinião pessoal), traduz uma época, pois fez as delícias dos mais despertos jovens dos seventies por então parecer um desafio ao establishment: chegou o longo poema a ser dramatizado por grupos de teatro independente que então cresciam pela cidade;
3)- esse tal poema dramatizado encontra ligação - outra vez uma opinião pessoal - com o conteúdo do filme Alphaville (esse sim de provocar frisson) de Jean-Luc Godard que tantos de nós vimos nos ciclos de cinema do Palácio Foz (eu não perdia um filme e o preço dos bilhetes era irrisório para os estudantes com falta do "vil metal");
4)- o poeta tem vindo a ser - opinião pessoal- injustamente esquecido, não lhe sendo votada a importância merecida.
... e mais não "direi", deixando um dos poemas falar por si próprio:

Caso alguém tenha curiosidade na autoria - os comentadores "conhecem-na" mas há que pôr fim a enigmas - o autor deste poema e da crónica Primus Inter Pares é o escritor Daniel Filipe.
Recado para a Amiga Distante

Dorme Menino dorme
teu sonho quieto lúdico
enquanto longe estoura
a bomba no atol

Que outra coisa Menino
poderemos fazer
ante o inominado
desconhecido crime
que de entre as chamas nasce
no silêncio da noite?

Que palavra inventada
que rubro gládio pode
definir o temor
do começo do mundo?

Que estranho abjeto ritmo
em cogumelo alastra
sobre o teu sono puro
Menino sobre a esperança?

(Um tigre humano vem
a cada esquina oculto
no rumor da manhã
saciar-se de sangue)

4 comentários:

gin-tonic disse...

Já bateu com a cabeça na parede as vezes necessárias. Tão cedo não vai esquecer ter esquecido de quem não se devia ter esquecido - também tu meu filho!
Já sabe a resposta mas também não a vai dizer. Lgo que outras repostas existam mostrará a sua em capa de disco.
Só não percebeu muito bem aquela de encontar as respostas das adivinhas no "Google"... Pensa que isso retira o gozo às adivinhas. Opinião pessoal, claro...

teresa disse...

:):):)
Como é possível (infelizmente é e não será exemplo único) que o autor destas linhas (e da crónica que ontem postei) seja tão injustamente esquecido?(pergunta retórica)
Quanto a adivnhar a "googlar", penso que todos os adivinhadores o fazem...
O gin está a prometer-nos inúmeras novidades (capas, discos), o que vale é que sabemos que cumpre as promessas:)

ABS disse...

La mort n'est jamais complète.
Il y a toujours, puisque je le dis,
puisque je l'affirme,
au bout du chagrin
une fenêtre ouverte,
une fenêtre éclairée.
Il y a toujours un rêve qui veille,
désir à combler,
faim à satisfaire,
un cœur généreux,
une main tendue,
une main ouverte,
des yeux attentifs,
une vie, la vie à se partager.

teresa disse...

E como "reza" a canção,
"hei-de ouvir o teu parecer
hás-de me dizer
se é cada coisa para seu lado
ou se isto anda tudo ligado", segue uma brevíssima referência ao clássico Alphaville (em copy/paste e com algumas correcções da construção):
« Da mesma forma que os fragmentos da poesia de Paul Eluard, citados ao longo do filme, emergem do fundo de uma massa sonora como pertencentes a um tempo inexistente ou a uma memória perdida, surgindo os versos como tentativa de reavivar lembranças, os faróis, as lâmpadas e os sinais de Alphaville parecem resgatar a cidade da noite eterna em que se encontra
O que Godard nos mostra muito bem é que se "a poesia transforma a noite em luz"- como afirma a personagem Lemmy Caution ao citar o poeta- só o mergulho na noite tornará possível o nascimento de um novo e claro olhar. E é justamente porque a poesia se encontrava perdida que ela brilhava constantemente na noite de Alphaville.»