11 de março de 2009

Não imbecilizar nem exigir o impossível

Actualmente, faz parte do currículo dos alunos do 5º ao 9º ano de escolaridade a área de Formação Cívica . São 45 minutos semanais leccionados (pelo menos na minha escola) pelo(a) director(a) de turma e, como tal, há que saber aproveitá-los a fim de ajudar a desbravar caminhos para a cidadania, a solidariedade, a justiça, a vida comunitária e a compreensão das diferenças, sobretudo numa época em que somos mais Babel do que Sião (filão que me encontro a explorar e expressão escolhida com referências óbvias) e que o hibridismo cultural é nota marcante num mundo em que a ideia de fronteiras e o conceito de Estado-Nação pertencem ao passado.
Tendo assistido à divulgação de resultados de trabalhos realizados com miúdos de 10 anos, fiquei surpreendida com o que foi, num passado recente, apresentado em oficina de trabalho.
A fim de não gerar zonas de penumbra, acrescento ainda não subscrever infantilizações de espécie alguma (em casa como na escola), pois não estaremos cá, pobres mortais, para resolver ad eternum os problemas que se irão colocar aos jovens de hoje ao longo das suas vidas certamente, na maior parte dos casos e ainda bem, mais longas que as nossas.
Pediu-se às crianças de dez anos que definissem conceitos como : Cidadania, Auto-Estima, Sociedade, Comunidade (estes retive na memória) entre outros que exigem idêntica abstracção, sobretudo nestas idades. Passo a referir algumas das respostas registadas por escrito e tão à altura dos (cada vez mais) inocentes(?) 10 anos:
Cidadania – doença muito contagiosa (penso que aqui o som se assemelhava vagamente à Síndrome dos nossos tempos, a SIDA)
Sociedade – local onde os homens bebem, jogam à bisca e as mulheres “cuscam” (o trabalho foi aplicado na minha escola com marcas de ruralidade evidentes, espaço onde as sociedades recreativas ainda têm expressão, mesmo que não seja a mais desejável com vista ao desenvolvimento)
Auto-Estima – resposta de um miúdo: «esta não sei explicar, mas vou dar um exemplo "o meu avô auto-estima a minha avó"».
Comunidade - conjunto de comunistas.
Acrescento que este mesmo trabalho de definição de conceitos tem revelado resultados interessantes com jovens já na adolescência e que os 45 minutos, desde que bem aplicados, poderão abrir novos olhares sobre temas que hoje – vá-se lá saber porquê – se encontram arredados da discussão pública e que são quase considerados hardcore. Saliento uma experiência interessante levada a cabo com alunos de 9º ano que começaram, na sua quase maioria, por defender a pena de morte e após terem estudado casos de condenação de inocentes acabaram por alterar completamente as posições iniciais. A conclusão que retirei é que estes assuntos não são debatidos em casa, mesmo quando o nível sócio-cultural das famílias o permite.
Para concluir, tudo quanto foi afirmado não implica que se não analise com as crianças os conceitos apresentados, há é que fazê-lo com a devida adequação ao seu nível etário.

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