10 de maio de 2012

Lisboa dos pregões


"Ainda tão recente e já tão longínqua! Lisboa sem os seus modernos bairros, menos vasta mas mais pitoresca! De manhã cedo ao entardecer, lá iam os vendedores ambulantes espalhar pelas ruas com a música dos pre-gões, a excelência dos seus produtos. Rompe a alvorada. Lá se ouve: fava rica! Era o despertador da cidade. De seguida, pancadas na porta da rua e a voz nasalada do leiteiro: leiiite! Estava a cidade desperta. De todos os lados se ouviam cantares. Franzino e apressado, corria o ardina: Diário de Notícias, olha o diário, Século, olha o diário! De cinta fina saracoteando as ancas com a canastra à cabeça, vinha a varina: vivinha da Costa! A frente de um burro com as cangalhas a abarrotar de hortaliça e de enferrujada balança no braço, ouvíamos o saloio: saloio! Saia rodada, bota de tacão, blusa, garrida, lenço de casimira, xaile aos ombros, cesto de verga no braço coberto de pano de imaculada brancura, apregoava a jovem queijeira: queijo fresco, quem merca o queijo saloio! "
Manuel Deslandes, Revista Almanaque, 1960

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