1 de dezembro de 2004

Citando..

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"Vou perguntar ao mais vidente se o meu futuro será sorridente" ("Linha - Vida" do LP "Anjo Da Guarda" - excerto)

António Joaquim Rodrigues Ribeiro nasce em Fiscal, pequena aldeia do concelho de Amares, Braga a 3 de Dezembro de 1944. O quinto dos dez filhos de Deolinda de Jesus e Jaime Ribeiro, António faz os seus estudos na escola local, ajudando no resto do tempo os pais no campo. Mas a paixão pela música demonstrada desde tenra idade fá-lo-á esquecer muitas vezes os trabalhos da lavoura em favor das romarias e folclore locais.

Aos 11 anos, terminada a instrução primária, experimenta o primeiro ofício em Caldelas. " Ia fazer quinquilharias, mas passado pouco tempo desistiu ", contará a mãe já em 1988, à Imprensa. Mal completa 12 anos abandona a terra natal rumo a Lisboa. Vem para ser marçano, mas acabará por trabalhar num escritório. A tropa fá-la em Angola, mas sem antes pedir à mãe que lhe acenda uma vela a Santo António para protecção. Regressa são e salvo. Mas logo volta a partir, desta feita para Londres, onde permanece um ano a lavar pratos num colégio.

Em 1976 regressa, de novo por pouco tempo. O próximo destino será Amesterdão, onde fica mais um ano e aprende o ofício de cabeleireiro.

Já em Lisboa, dedica-se de dia ao ofício, e à noite à sua paixão pela música, dando espectáculos com um grupo de músicos intitulado " Variações ". E começa então a ser notado pelo seu visual excêntrico e personalizado, com base nas cores e formas originais e em alguns elementos de adorno, como por exemplo os brincos.

Em 1978 apresenta uma maqueta com algumas músicas à editora Valentim de Carvalho e nesse ano assina contrato. Mas terá de esperar quatro anos para poder gravar, porque entretanto Mário Martins e Nuno Rodrigues insistem para que grave, respectivamente folclore ou pop.

Os contactos com profissionais do mundo da música, seus clientes na barbearia, abrir-lhe-ão, entretanto as portas da notoriedade.

Em Fevereiro de 1981 surge pela primeira vez na televisão, no "Passeio dos Alegres" de Júlio Isidro, que o convidará para algumas emissões da "Febre de Sábado da Manhã" na Rádio Comercial.

Em Julho de 1982, já sob o nome António Variações, edita o seu primeiro single, um duplo lado A com "Povo Que Lavas No Rio" - imortalizado por Amália Rodrigues - e "Estou Além", um inédito de sua autoria. Um ano depois sairá o primeiro LP- "Anjo Da Guarda"- que o transformará numa estrela popular à escala nacional.

Depois de inúmeros concertos na época estival, sobretudo em festas e romarias de aldeias e outras pequenas localidades, volta a entrar em estúdio. Entre 6 e 25 de Fevereiro de 1984 grava o segundo e último LP; "Dar E Receber".

Em Abril aparece pela última vez em público no programa televisivo "A Festa Continua" de Júlio Isidro. Será a única interpretação no pequeno ecrã das faixas do novo disco. Quando "Dar E Receber " é editado, semanas mais tarde, já António Variações se encontra internado no Hospital Pulido Valente devido a um problema brônquico-asmático. É já no hospital que ouvirá pela primeira vez na rádio as músicas de promoção do disco.

Debilitado pela doença que se agrava vertiginosamente, é transferido a pedido da família para a Clínica da Cruz Vermelha, onde virá a falecer a 13 de Junho.

O Adeus do Variações

"Tenho pena de morrer, mas não medo. Tudo o que acaba me deprime. Mais pelo fim do que pelo acto em si." - palavras de António Variações à Imprensa, poucas semanas antes de morrer.

Em 1984, a SIDA era ainda considerada como "praga dos homossexuais" e raros seriam os casos diagnosticados em Portugal.

Em Junho, a comunicação social anunciava o grave estado de saúde de António Variações. Logo se levantam as primeiras suspeitas em relação ao problema brônquio asmático que levara ao seu internamento no hospital Pulido Valente no dia 18 de Maio e à sua transferência para a Clínica da Cruz Vermelha. "Aquele a mim nunca me enganou, está mesmo a ver-se que está com isso", podia ouvir-se um pouco por toda a cidade. Mas nem todos viraram as costas a António Variações. Na clínica, recebia a visita dos Heróis do Mar, companheiros do último disco editado já durante a sua hospitalização. Foi mesmo no hospital que ouviu uma das faixas na rádio, pela primeira e última vez.

No mês em esteve internado, António Variações emagreceu vinte quilos. Segundo palavras da irmã, mantivera-se lúcido sendo a tosse o que lhe provocava maior sofrimento, fazendo-o mesmo pedir para morrer.

E na madrugada de 13 de Junho, a morte levou o criador de "Estou Além". A polémica em torno da sua doença torna-se tema de destaque, não por preocupação com o cantor, mas por constituir para muitos o primeiro caso conhecido de SIDA em Portugal.

Broncopneumonia bilateral extensa seria a causa apontada para a morte do cantor, mas os cuidados extremos durante a autópsia e a selagem do caixão "por constituir perigo para a saúde pública" agravariam as suspeitas.

Ao velório na Basílica da Estrela acorreriam Amália, Maria da Fé, Lena D’Água e elementos dos Heróis do Mar. Mas a maioria seriam os jovens de liceu, as velhinhas, os colegas de profissão - barbeiros - que vinham assim despedir-se do seu ídolo.

Os restos mortais de Variações seriam depois transportados no dia 15 para o cemitério de Amares, onde se encontra sepultado.

As declarações pouco esclarecedoras dos médicos e os desmentidos mantidos até hoje pela família acabariam por encerrar a polémica.

Hoje me dia a SIDA é já olhada a uma outra luz e já não se considera ser o "castigo para homossexuais" de 1984. Se António Variações foi a sua primeira vítima declarada ou não é o que menos interessa. Interessa antes lembrar a descriminação e críticas de que foi alvo nos últimos tempos de vida. "


http://www.citi.pt/cultura/musica/musicos/a_variacoes/



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