4 de abril de 2014

"Um poeta não deve furtar nada do bolso da natureza"*


Dois dias no Encontro Ler +, na qualidade de quem pretende unicamente escutar, saindo de rotinas quotidianas . Fala-se de Humanidades e Ciências, da importância da ciência escrita, do imperativo da sua clareza, a fim de poder ser entendida por um público mais alargado desenvolvendo-se, deste modo, a literacia científica. Um responsável por uma editora nacional, pioneira em publicar, na nossa língua, livros deste cariz para um público alargado, pede braços no ar, perguntando aos presentes se leram Cosmos de Carl Sagan. Lembro-me de ver o livro passar, lá em casa, pela mão de alguns, não recordo se o li, mas sem gravador de vídeo, não perdi a emissão de um único episódio da série que, no século vinte, passava na RTP (alguém comenta que a série Cosmos passa, de novo, num canal televisivo). Falhando-me a memória, não levanto o braço. O mesmo sucede a cerca de dois terços da assistência. A propósito de ciência, recordo ainda os documentários de Jacques Cousteau , o fascinante mundo submarino que teve o mérito de desvendar ante os nossos olhos deslumbrados. Recuando no tempo, evoco de forma nebulosa as conversas acessíveis do cientista António Manuel Baptista, homenageado por ter completado, há pouco, 90 anos. Fico a pensar se a questão associada à pouca leitura de Cosmos será determinante para retirarmos conclusões. O editor afirma que, nos anos 70- 80, a lista dos mais vendidos incluía autores como Carl Sagan, James Gleick, James D. Watson, cruzando esses dados com os dos títulos hoje mais populares nas livrarias (ao ser a questão deste modo abordada, surge uma imediata apreensão). Apresenta ainda um impressionante número de reedições das obras, num passado recente, quando eram muito procuradas. Interrogo-me, sem resposta, se será a afirmação determinante para retirarmos conclusões, embora algumas teimem em surgir  em primeira instância , ainda isentas de ponderação. Um dos oradores refere-se à televisão pública – algo por tantos de nós repetido em conversas informais, entre amigos – ao facto de se encontrar arredada do papel formativo, abstendo-se, por isso mesmo, de espicaçar a curiosidade, fazendo mais sentido haver apontamentos breves e pedagógicos, destinados aos mais novos, no horário em que, em nossas casas, se prepara o jantar e as tarefas escolares já estão concluídas até ao dia seguinte, ao invés de serem passados concursos (lúdicos?) de formato internacional e que pouco acrescentam à formação de quem se senta em frente ao ecrã.


Penso, em tom de conclusão, no processo de simbiose presente nos textos poéticos de António Gedeão/Rómulo de Carvalho e, nem a propósito, a concluir a homenagem ao nosso cientista de 90 anos, uma familiar sua termina a cerimónia com a leitura de uns versos de Samuel Coleridge, tão ao gosto do homenageado
*«um poeta não deve furtar nada do bolso da natureza».

(e como não tenho cá em casa o tal livro talvez por ler, vou regressar a Hubert Reeves e fica Sagan como número dois na lista de intenções de leitura)

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