21 de setembro de 2011
Blogues, redes sociais e outras coisas mais...
(imagem: techshout.com)
Com o correr do tempo, surge dificultada a tarefa de encontrar matéria de postagem. Ter um interesse preciso facilita a redação : cinéfilos, autores de recensões literárias, apreciadores de música ou de gastronomia optam por escrever sobre o que lhes traz entusiasmo diário, o que não sucede com generalistas.
Quando se vai escrevendo ao sabor dos acontecimentos, das memórias, dos pequenos apontamentos quotidianos, fica a sensação de, muitas das vezes, se reescrever o mesmo sob diversas roupagens.
Os últimos tempos parecem ter trazido significativas mudanças à blogosfera, ficando-se a pensar em épocas de um passado ainda recente, quando certos comentários se afiguravam ainda mais interessantes do que alguns posts propriamente ditos. Como rápida explicação, uma das potencialidades da rede social mais popular e que consiste no clicar em «gosto», traduz-se em função cómoda, a convidar à facilidade de ter de pensar pouco e de escrever ainda menos, fator preocupante para quem lida diariamente com questões como a da literacia , indissociável do exercício da reflexão crítica.
Sobre a matéria, relembra-se uma recente conversa com uma estudante universitária. Falava-se sobre um caso merecedor de estudo e relacionado com alguém com o diagnóstico de mitómano que, desejando ter uma infinidade de «amigos», criou um impressionante número de contas nas quais inventava fotografias e perfis diversos, passando o dia a comentar as próprias publicações. Olhando superficialmente o episódio, poderá parecer o mesmo hilariante. Em abordagem mais cuidada, somos de imediato remetidos para a expressão da «solidão acompanhada», ou seja, fica-se a magicar no facto de vivermos num tempo e num lugar estranhos e, falsos moralismos à parte, incomoda imaginar a anulação da vida real em troca de procedimentos de faz de conta que, levados às últimas consequências, poderão ser potenciadores de incontroláveis irritações quando, ao toque do telefone, se descobre do outro lado da linha um amigo de longa data, esse sim com existência real .
A história do mitómano fez-me lembrar um dos meus primeiros correspondentes de postais. Ele era um meu vizinho que um dia me confessou que se correspondia consigo mesmo. Então eu decidi começar a mandar-lhe postais de vários pontos de Lisboa e assinando com nomes diferentes. Coisas da adolescência :)
ResponderEliminarE a falta que faz um botão "Não gosto"...
ResponderEliminar"Gosto" é cómodo, convidativo a passar à frente, sem demora.
"Não gosto" implicaria justificação.
Mas talvez perceba que num mundo de quotidianos céleres...não teria grande sucesso.
Convenhamos que foi um gesto amigável, lalage:)
ResponderEliminarNão teria decerto sucesso, José Quintela Soares, embora se confirme ser «a pressa inimiga da perfeição», sempre que alguém deixa no FB referência a uma doença grave(exposições discutíveis) ou ao número de vítimas do atentado do 11 de Setembro e por baixo se repara que dezenas de «facebookianos» clicaram em «gosto», algo está mal (para se ser suave) no reino da Dinamarca...
ResponderEliminarUltimamente tenho pensado muito no que se fala aqui (post e comentários).
ResponderEliminarAssusta-me ver gente a dizer que gosta quando alguém diz: "dói-me os dentes". E depois o que eu vejo... ninguém é realmente amigo de ninguém. Um exemplo muito fresco na minha vida é um colega lá da estufa. Tem 19 anos e acha que é dono do mundo.
Há tempos disse que não precisava de amigos na Suíça (ele é da África do Sul) porque eu chegava, pois eu não me calo, então falava por todos.
Andou, andou até que um dia, pensava que estava a falar com alguma colega dele ou uma irmã, abusou da sorte e eu mandei-o dar uma volta. Resultado, os muitos amigos que ele tinha, concentrados na minha pessoa, desapareceram... e eu, depois deste incidente, não sei porquê, dei comigo a analisar-lhe o FB. Sim, eu sei que é assustador, mas eu queria entender como é que ele vive sem amigos por cá. E não é que eu tenho visto que os muuuuuitos amigos que ele tem (tinha?) na terra dele simplesmente vão diminuindo e diminuindo as interacções com ele, apesar dos milhentos textos apelativos que ele escreve no seu mural?!?!
Eu não estava à espera que a "amizade" dele durasse eternamente (10 anos de diferença é muito a nível de objectivos de vida e eu não tenho paciência para criancinhas), mas acho que o facto de ele (e tantos outros) viver dentro deste mundo virtual fez com que não soubesse tratar gente de carne e osso, acabando por ficar sozinho tão longe de casa...
Acho que o filme que retrata a vida de um dos fundadores do FB retrata isso mesmo muito bem, nos últimos dois minutos...
Boa reflexão, Luísa.
ResponderEliminarAcontece que quando se é 'mau feitio' como o colega que refere, até a comunidade virtual lhe vai fugindo, certamente começará a agredir verbalmente os seus contactos nessa 2nd life.
Quanto ao filme que refere, confesso que me decepcionou um pouco. Não sei até que ponto é o retrato do protagonista fiel ao do homem real, no filme consegue ser estranho até na forma como se relaciona com quem o rodeia, brilhantismos informáticos à parte... Mas ainda hoje comentava com a minha mãe a questão da inteligência quando ela se referia a uma figura intelectual do seu tempo (das ciências exactas) como sendo muito válida na sua área e, simultaneamente, anti-social, o que para alguém que exercia a docência trazia, mesmo com alunos adultos, alguns problemas diários.
Sem gostar de generalizar, penso que a "genialidade" com frequência surge associada a traços comportamentais específicos. Hoje a conversa familiar saltou mesmo para um génio retratado num outro filme: o Nobel da Matemática interpretado por Russel Crowe.