1 de fevereiro de 2010
Na voragem do tempo: escolas e cabines telefónicas
(agradecendo à Teresa M. a fotografia)
A maternal avó Antónia, sempre pronta a confortar após severas reguadas dadas pela professora primária e a apaziguar guerras de irmãos de idades muito próximas (mas até hoje ligados como que por um «sexto sentido»), encantava com as narrativas de juventude: a importância de uma «verdadeira senhora» usar chapéu; a troça e apedrejamento a que uma jovem, no Rossio dos anos 20, esteve sujeita por ter ousado apresentar-se com uma arrojada peça de vestuário mais tarde conhecida por saia-calça; as simulações de gravidez para se conseguir um lugar de privilégio nas bichas de racionamento de pão durante a guerra com almofadas a cair sob o vestuário e insultos a doer para as mulheres que tal ousavam…
Os relatos com que me deliciava eram ainda coloridos de memórias musicais de uma infância e juventude vividas junto aos teatros lisboetas: cantava de cor, muitos anos mais tarde, os números de revista do passado a que havia assistido com «raparigas da sua criação».
Estórias de vida que contemplavam ainda só existir na época a manteiga e a banha «agora é isto da Planta e da Flora» o sabão macaco «tanto detergente para isto e para aquilo» e que abrangiam ainda os transportes citadinos como
« o chora», comerciantes desonestos «a dona da tasca que vendeu literalmente gato por lebre e a leiteira presa por adicionar substâncias ilícitas (nem me atrevo a referir quais) ao leite para facilmente enriquecer»…
A magia do passado apresentava-se, a meus olhos, como ficção romanesca à altura de grandes autores da América Latina.
Voando para este século XXI a imparável velocidade , mesmo para quem tenta não se deixar enlear na voragem, surpreende pensar em utilidades de um passado recente quase convertidas em «espécies em vias de extinção»: refiro-me pontualmente a alguns edifícios escolares do plano centenário e às cabines telefónicas.
Parece louvável que os primeiros sejam preservados, mesmo que para outros fins, sendo respeitada a sua traça – destaco o Centro de Educação Ambiental à saída de Évora e um outro, na Comporta, transformado em restaurante de cozinha tradicional.
Quanto às cabines telefónicas de modelo made in Great Britain, foi-me grato ter ficado a saber que algumas estavam a ser reutilizadas na qualidade de bibliotecas juvenis.
Eu não gostava do modelo de ensino administrado noutros tempos (com algumas excepções), mas as escolas que eram mais lindas que as de hoje eu não tenho dúvidas. Então esta que a foto documenta é uma beleza...
ResponderEliminarEstas escolas do Estado Novo, designadas por de 'plano centenário' eram sem dúvida feitas para durar e de estética harmoniosa embora, nos nossos dias, revelem falta de espaços imprescindíveis como biblioteca ou centro de recursos.
ResponderEliminarPor isso (mesmo que seja a sua época de construção cinzenta) é agradável ver que algumas são hoje adaptadas a outros fins.
Olá Teresa,
ResponderEliminarAlgumas dessas escolas, como uma que vi em Belém ainda tem o muro que separava a ala das meninas e dos meninos.
Tenho visto algumas que hoje são residências de férias e outras voltadas para o negócio,artesanato etc..
É óptimo saber que essas adaptações possibilitaram mantê-las vivas, embora à beira de extinção.
Kandandos
Ainda existem escolas em Lisboa muito bonitas. É ir visitar a do Jardim do Torel:) Ou a antiga escola nº 1:)
ResponderEliminarOlá Kimbanda,
ResponderEliminarÉ bom verificar que muitas não entram em derrocada e, mais do que isso, são utilizadas para fins culturais ou outros de interesse público (como o restaurante que refiro no 'post')
Um abraço extensivo à simpática família:)
É verdade ,T
Considero ainda um clássico a das Azenhas do Mar, lindíssima e de bom enquadramento paisagístico:)