(paisagem quotidiana)
Datas equivalem a meras convenções embora, por vezes, tragam a marca simbólica à existência de cada um, tendo sido ideia a conduzir ao post…
Ouvindo há dias um grande mestre britânico, cidadão do mundo, com um saber(também) trazido pela relativamente longa existência, professor orgulhosamente auto-proclamado como filho da working class que conseguiu enganar um determinismo muitas vezes indissociável não de quem tem mais mérito, mas de quem foi materialmente favorecido pelas circunstâncias e tendo dedicado uma vida a auxiliar outros a “iludirem o fatalismo social” , apreciei o seu conceito de «capital narrativo» segundo o qual, as vivências partilhadas de cada um são importantes no estabelecimento de um sentido para a existência. Receando tornar-me fastidiosa, pretende-se com isto dizer que quem não tem a sua narrativa pessoal e apaga memórias, vogando no cinzentismo dos dias, dificilmente conseguirá “convencer”, seja na governação, seja no dia-a-dia , seja em conversas mais ou menos casuais (ainda hoje recordo conversas marcantes com passageiros nunca mais ‘revistos’ em longas viagens de comboio…), seja naquilo que for. Ganha a constatação os contornos de um ‘cântico ao individual’ ( não ao individualista) à maneira de Whitman em One’s Self I Sing.
Por isso mesmo, a entrada num novo ano só se reveste de significado enquanto balanço do que se fez e do que se pretende (com maior ou menor sucesso) realizar, tudo o resto serão datas de calendário… e encare-se aqui cada ano como cada subida de Sísifo à montanha, sem rendições.
Passando em revista – meio século (ou um pouquinho mais) decorrido - este «ritual de passagem» ao longo dos tempos, elegeria como o ritual um ido 31 de Dezembro vivido pelas ruas da cidade em companhia de um ínfimo grupo de pessoas queridas. Ruidosas (e mais ou menos vistosas) comemorações, vivências muito distantes do país em verdadeira "Babel", jantares em casa de amigos e conhecidos, tudo perde expressão em frente a esse momento marcante. A noite estava chuvosa, o fogo de artifício a cair no rio acabou por resultar em fiasco, a travessia da passagem de peões sobre Belém revelou-se um momento bem-humorado pela feliz coincidência de encontros casuais com amigos, coisa impensável no meio da confusão de gritos e de gente a transportar espumante e copos descartáveis…
Em jeito de conclusão, fica o desejo de que o Novo Ano tenha (e as desculpas se for despropositado
desejar para os outros os votos pessoais) o valor simbólico de algo recheado de boas surpresas, muitas
delas
– poderá parecer utópico ou talvez de interesse exclusivo para a escriba – criadas no quotidiano através do “desligar” das coisas mais cinzentas, da capacidade de respirar fundo, de ver «verdadeiramente vista» uma paisagem , de mergulhar numa sonoridade com significado, de parar deliberadamente – de preferência em local aprazível - para passar em revista os acontecimentos diários…
Desejos a todos os que por aqui passam de um bom 2010, mesmo que as divagações possam surgir desprovidas de sentido (é que felizmente não somos ‘clones’ e cada um tem o seu capital narrativo).
É sempre tivial mas que podemos fazer, Teresa?
ResponderEliminarUm bom ano, boas leituras, bom trabalho.
Um abraço
Abraço Gin e tudo a correr pelo melhor (coisa que gosto de desejar todos os dias, independentemente da data).
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