17 de setembro de 2009

Never smile before Christmas???

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Em tempos algo distantes não perdia um título do psiquiatra Daniel Sampaio: sentia que para todos aqueles que lidam com adolescentes – em casa e na escola – esses livros eram como que uma espécie de ‘cartilhas’ (não confundir com catecismos) contendo dicas importantes ou, no caso pessoal, tornavam-se manuais de instruções em edições continuamente melhoradas.
Aos poucos, fui largando as “cartilhas” por se tornar a opinião cada vez mais oscilante em relação aos conselhos divulgados (talvez a lei das probabilidades explique que a profusão de publicações conduz inevitavelmente a um afastamento de consensos…).
Serve este preâmbulo para salientar um lema por alguns religiosamente seguido na relação dentro da sala de aula. O autor (e aqui já não me recordo em que obra e não tenho tempo para verificar), salientando estratégias na prevenção da indisciplina, indicava que alguns professores seriam adeptos da directiva: “never smile before Christmas”. Não sei se tal austeridade surtirá efeito mas, no caso pessoal, a aplicá-la, sentir-me-ia qual Mr. Hyde em permanente frustração por não conseguir (com o indissociável fatalismo pegado com Araldite) reaver a personalidade de Dr. Jekyll , nunca se tendo tornado desastroso – pelo menos até 17 de Setembro de 2009 - aplicar (sem estudos prévios) o espontâneo “smile whenever you want to”.
Penso que cada um é único (espero) e, relembrando (faço-o com frequência) os competentes psicólogos com quem trabalhei na prevenção de comportamentos de risco na escola , a melhor receita individual é a autenticidade, ou seja, quem é ‘master and commander’ não deve – de modo algum – tentar imitar o colega do lado que gosta de meter algumas ‘buchas’ humorísticas para desanuviar a agrura de certos conteúdos (isto só resulta se houver forma de não deixar o plano de aula descambar em ‘stand- up comedy’) e os dóceis por natureza correrão riscos se tentarem ser ríspidos a tempo inteiro... E tudo isto me trouxe à memória uma reunião de pais na qual algumas mães – são elas a participar em maior número nestes eventos – me pediam:”professora, não leve a mal o conselho, mas apertem com eles… é que alguns querem seguir a carreira militar … é bom que comecem desde já a ficar preparados!”.
Constatando com satisfação não sermos todos uma espécie de fotocópias (o papel químico há muito que prescreveu), saliento duas reacções antagónicas ante o inesperado: a B. que , junto a nós, chorava copiosamente na sala de professores ao ter lido numa resposta de um aluno ‘criativo’ ser ela a autora do Auto da Índia de Gil Vicente (por respeito pela dor alheia, não lhe perguntei se o pranto seria de comoção ante tão elevada distinção…) e o P. que, ao verificar num teste a seguinte caracterização de Maomé: “cristão convertido ao islamismo” sem revelar qualquer laivo de desalento , comentou discretamente e longe dos miúdos : “tipo, Cat Stevens”. É opinião própria – com a subjectividade inerente - que o desânimo e posterior zanga perante algum nonsense conduzem mais facilmente à confusão do que mostrar ou não os dentes entre o público juvenil. E, terminando com a ideia pedagógica que me é grata,’ nunca entrar em desalento’ que é como quem diz em terras de Mia Couto 'cada dia é cada dia', o que é preciso é 'tranquilidade' (aqui já citando um determinado treinador), estas são as ideias a 'agarrar', mesmo quando alguém de neurónios mais ‘tenros’ refira com propriedade que «as ‘lêndeas’ (e nunca as fábulas!) são narrativas em que os animais falam para nos ensinarem a ser gente»…

10 comentários:

  1. Não é nada fácil ser professor ou aluno nos nossos dias que voam...
    Cumprimentos,

    Carla Jané

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  2. Grata pelas palavras,Carla.

    Não sendo fácil - pelo menos no que diz respeito à primeira tarefa - traz (opinião pessoal) entusiasmo por constituir a cada momento um desafio (até à data).

    Cumprimentos.

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  3. Eu sou uma leiga total nestas andanças, mas desde sempre achei que mais importante do que ler teórios e "cartilhas" era mesmo entrar no mundo dos miúdos (livros, tv, música e por aí fora) para ver para que lado nos havemos de mexer, que coisas havemos de invetar para os cativar. Mas lá está... sou uma leiga.
    No entanto, acho que a minha (ex)orientadora devia ler seu texto. Aprendia que com os miúdos (principalmente como os da minha turma, de um meio problemático e com milhres de carências) nem sempre vão lá com berros, ameaças, olhares feios etc. etc. etc. O que eu mais odiava era quando ela dizia: "Berre com eles se preciso for!" Ela diz que estudou na FLUL, ainda gostava de saber quem lhe ensinou pedagogia...

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  4. Olá Luísa,

    Este seu comentário tão interessante, merece algumas pequenas notas :

    Penso que na relação pedagógica ainda vigora - opinião pessoal - uma frase pouco ortodoxa de alguém distante no tempo e na cultura(que aqui 'até' estava certo): «Não interessa que um gato se pareça com um gato... o que importa é que cace ratos.»:)

    Quanto à temática 'berros', posso desabafar que para além da falta de estética dos mesmos (e da poluição sonora decorrente), sou-lhes tão avessa que, quando a eles recorro (às vezes com intervalos de vários anos e em situações pontuais), fica tudo mudo e de olhar arregalado (devem pensar: 'isto está gravíssimo! '): quem se 'defende' com gritaria diária deixa de ser levado a sério por banalizar tal prática:D

    Infelizmente existem 'orientadores(as)' e 'desorientadores(as)', só exerci tal tarefa durante um ano e um pouco por não haver alternativas (embora a FPCE me tenha dado todo o apoio técnico necessário na época e já lá vão mais de dez anitos);

    Os 'meus miúdos' pertencem em grande número a famílias pouco 'letradas' e com problemas sociais: desemprego, alguma desordem sócio-afectiva (não sendo propriamente os meninos do colégio de elite e prefiro estes últimos, pela simplicidade e não por algumas estórias de vida, é certo, que não gosto de divulgar, só quando estritamente necessário para que sejam entendidos e mais estimados pelos restantes agentes...), portanto compreendo-a e concordo, estes alunos(que conheço e com quem trabalho) têm uma coisa boa - são sensíveis a um trato civilizado recorrendo eu, para tal(entre outras estratégias), aos decibéis aceitáveis:)

    Uma colega mais velha, ouviu um dia em casa quando falava alto: 'pensas que estás lá na escola com os teus alunos?', coisa que eu não gostaria de ouvir...e ainda não ouvi até hoje:)

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  5. 'prefiro os da minha escola, não os do colégio em que fazem testes de QI, o que é verdade!'

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  6. Eu também gosto dos miúdos reais, não sei como lidar com os do mundo de "plástico".
    Mas para a minha orientadora, ser pobre é uma defeito. E venha quem vier, mas ela odiava dar aulas à minha turma porque eram uns "coitados". Como eu não sou de famílias ricas, nasci e cresci na aldeia, vivi com filhas de todo o tipo de desgraça e não me perdi nenhum pedaço por causa disso, conseguia perceber os miúdos e adorava dizer, quando eles mereciam, que estavam certos. É tão bom ver os olhinhos deles arregalados e a dizer "a sério, stôra?".
    Mas ela não. Como é "menina bem" e não sabe lidar ocm os "pés descalços"... berra e berra e berra (ela era boa para sirene de bombeiros). O que eu nunca entendi é como é que ela tinha força para berrar às 8h30 da manhã. A essa hora, nem os miúdos eram tão enérgicos!!!
    A sorte é que eu sei que não são todos como ela. E ainda tenho um pouquinho de esperança que as coisas hão-de mudar para melhor. :D

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  7. ... e apesar de concordar com o último comentário na globalidade, devo acrescentar - e aqui penso que a Luísa irá entender - que o mundo não é completamente 'a preto e branco', ou seja, também sei de quem se encontre nas tais escolas de elite e depare com número significativo de miúdos completamente perdidos em completa auto-gestão (tão mau como o super proteccionismo) sendo, por vezes, filhos de pais muito influentes e 100% trabalhólicos.

    E quanto a esperar por dias melhores, há que pensar 'I have a dream' ou 'we shall overcome someday' (e se não for pedir muito, que esse dia venha depressa):)

    Uma colega super-bem (com aquela entoação de voz própria do estereótipo), dizia uma vez numa escola talvez ainda hoje posicionada no 'top ten' da indisciplina por se encontrar inserida numa área cujo tecido social é muito complexo: 'e fui eu tão bem educada para isto'... pode parecer caricatura mas, nesses casos, as medidas de funcionamento deviam - parece-me- obedecer a regras muito específicas com verdadeiras equipas a trabalhar para o mesmo fim.

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  8. Sim, tenho plena consciência do que se pode passar dentro de um colégio com miúdos que têm esse tipo de papás, cheguei já a ouvir que alguns pais deviam perder a custódia dos filhos e não era por andarem na rua a pedir esmola ou serem dependentes de drogas. Eu falo mesmo no geral. Temos que ver que dos "coitados ricos" há meia dúzia, dos "coitados pobres", infelizmente, cada vez há mais...
    Quanto à "colega bem", se tivesse realmente sido "bem educada" nunca faria tal comentário! Mas pronto, volto a dizer, não são todos assim! E o dia há-de chegar! :D

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  9. Cativar e ser cativado. Conhecer o “outro” – mesmo quando são 25 ou 30. Uma arte tão difícil como a de educar um filho no e para o equilíbrio. Frequentei escolas particulares e públicas, numa altura em que a clivagem económica e cultural entre os alunos de umas e outras não era tão acentuada. Professores inspirados e inspiradores tive poucos – os que nunca esqueci e que comigo partilharam o amor ao conhecimento que lhes brilhava nos olhos. Afortunadamente, os meus pais também eram pessoas e educadores inspiradores. Quando estes pais faltam, a tarefa dos professores é ainda mais solitária e espinhosa. Um feliz ano lectivo para todas!
    Cumprimentos,

    Carla Jané

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  10. Obrigada, Carla, pelos votos de bom ano (da parte de muitos para quem o ano começa em Setembro e não em Janeiro).

    E seguindo o lema 'destacar sempre o que é bom e dar pouco relevo ao mais cinzento', lembro com muita nitidez o meu professor de Psicologia (um senhor de Évora que, antes das aulas, corria em fato de treino e sapatilhas), a minha querida e ainda hoje amiga professora de Inglês que ditou muitíssimo (ela sabe-o) a minha escolha profissional, o professor de Geografia (dizem que era filho de um rei que deixou muita descendência e constituía exscepção às 'marcas' da monarquia) e a minha especial orientadora da FCSH que - e aqui já eu não era uma jovem aluna - nunca esquecerei:)

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