7 de março de 2009

COMO POR DANIEL FILIPE SE VOLTA, UMA VEZ MAIS, A NAZIM HIKMET

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Começa por pedir desculpa pela qualidade da imagem, mas acontece que não consegue digitalizar a capa de um LP. Dado o seu tamanho não cabe no “scanner”. Pediu ajuda mas baralhou-se e ficou a pensar que o assunto necessita de mestrado, não sei quê photoshop, fazer cópia das partes da capa, juntar não sabe onde, rodar os layers para acertar a geometria da capa, enfim largou a tarefa, tirou fotografia da capa e assim ficou…
Ter batido com a cabeça na parede por causa de não saber quem escrevera o texto que a Teresa colocou à procura de autor tem uma justificação – esteve há umas duas semanas com o livro na mão. Mais ainda: quando o Carlos aqui disse que descobrira Nazim Hikmet citado por outro poeta, a ele também lhe acontecera o mesmo. Quis lembrar quem era o poeta, andou às voltas e não encontrou a referência, e agora, por causa do desafio da Teresa, chegou à “Pátria Lugar de Exílio” do Daniel Filipe. Era ele o poeta:

“Neste ano de 1962
não como Nazum Hikmet no avião de pedra
mas na minha cidade
livre de ir onde quiser
e no entanto prisioneiro
neste ano de 1962
exactamente
em Lisboa
Avenida de Roma número noventa e três
às três da tarde”

Curiosamente foi encontrar, dentro do livro ,um recorte de jornal com um poema de Nazim Hikmet. Pelo tipo de letra parece-lhe ser do Suplemento Literário do “Diário de Lisboa”, no tempo em que os jornais tinham suplementos literários:

“Adormecer agora
e acordar daqui a cem anos, meu amor
- Não
eu não sou um desertor
e não tenho de resto medo do meu século
meu século miserável, escandaloso,
meu século corajoso, heróico e grande
Nunca lamentei ter vindoi ao mundo demasiado cedo
sou do século XX, e disso orgulhoso.
Basta-me estar onde estou, entre os nossos
e lutar por um mundo…
- Em cem anos, meu amor…
Não, mais cedo e apesar de tudoi.
Meu século que morre e renasce,
meu século –serão belos os seus últimos dias
a noite terrível despedaçada por gritos de aurora
meu século explodirá de sol,
minha querida, como os teus olhos”

Regressando à capa do disco. Trata-se do longo poema “A Invenção do Amor” dito pelo próprio Daniel Filipe, com um sentir, uma serenidade, uma clareza profundamente arrepiantes. A música que se ouve em fundo, foi improvisada sob audição da voz gravada de Daniel Filipe e foi composta por Marcos Resende e Rui Cardoso que também fazem o acompanhamento tocando piano eléctrico e piano (Marcos Resende), flauta, sax-alto, sax soprano (Rui Cardoso):

Um cartaz na cidade denuncia que um homem e uma mulher se encontraram num hotel numa tarde de chuva e inventaram o amor com carácter de urgência souberam entender-se sem palavras inúteis apenas o silêncio a policia de costumes avisada procura os dois amantes antes que a invenção do amor se processe em cadeia há pesadas sanções para os que auxiliarem os fugitivos o perigo justifica-o não precisam de dar o nome e a morada e garante-se que nenhuma perseguição será movida nos casos em que a denúncia venha a verificar-se falsa é preciso encontrá-los antes que seja tarde importa descobri-los onde quer que se escondam antes que seja demasiado tarde e o amor com um rio inunda as alamedas praças becos calçadas (1)

No lado B estão outros poemas de Daniel Filipe mas ditos pelo actor Mário Viegas.

_______________________

(1) Colagem de frases retiradas de “A Invenção do Amor”.

20 comentários:

  1. Esse disco é uma preciosidade, ainda mais atendendo a que Daniel Filipe é mais um dos esquecidos nesta terra.

    teresa

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  2. Fotografa em plano superior para não dar essa ar embarrilado à foto. Do resto o PhotoShop trata.

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  3. este foi o poema que me fez andar atrás do nazim hikmet!!!!
    e tenho também esse cd.
    aquele livrinho da colecção forma (?) era uma delicia (acho que também foi no rol dos estragados no buraco negro de lisboa.
    injustissimamente esquecido, como se diz ali acima.
    o mário viegas reconciliou-me com a poesia dita (sim, faço parte dos que toda a vida odiaram a forma de dizer do vilarett e da sua escola).

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  4. Eu tenho esse livro. Se quiseres ofereço-te.

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  5. Eu tenho esse livro. Se quiseres ofereço-te.

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  6. pedindo desculpa ao gin, mudei a foto por uma que acabei de fazer aqui em casa.

    poderás sempre regressar à tua.

    quanto ao livrinho... mmmm
    teremos que falar nisso t :)

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  7. Sobressaltou-se quando leu o primeiro comentário do Carlos, pois ele dizia que tinha o CD da “Invenção do Amor”. Ia de imediato perguntar onde o comprara quando viu, pela publicação da capa, que o que ele tem é o LP. É que o disco dele está riscadinho por, in illo tempore, ter rodado tanto. Tem andado à procura mas nada, edita-se tanta porcaria e
    é lamentável que um disco como este não exista em formato CD.
    Quanto à capa diz que está muito bem assim – tem aquele tom q b de amarelecido que lhe dá um tom, uma patine de que gosta mesmo.
    Obrigado. Também um abraço.

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  8. o vinil sempre se pode digitalizar meu caro gin.
    talvez isso seja um bom tónico.
    :)

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  9. É verdade, caro Anónimo. Indicaram-lhe mesmo alguém em Oeiras que leva 40,00 por cada disco. Ouviu alguns e os CDs saídos depois da limpeza ficam um "brinquinho", Acontece que ele tem um porradão de LPs, nunca editados em Cd, que exigem digitalização. É uma nota preta. Vai jogando no euromilhões pode ser que ganhe uns centimos que permitam avançar qualquer coisinha. Até lá, um amigo, gravou alguns Lps do vinil para CD mas sem limpeza continuam com os ruídos de batata frita.
    Na mesma um obrigado pela sugestão.

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  10. Este anónim oé o Carlos. Pede-lhe:)

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  11. O lado B deste LP - com os poemas de Daniel Filipe ditos por Mário Viegas - está reposto em CD no livro-disco "Mário Viegas - Discografia Completa - 2 - O Operário em Construção - 1969 - 1973 - 1974", editado pelo Público em 2006. O lado A, com a voz de Daniel Filipe (e que era já uma reposição do suporte original, em 10"), é que se encontra esquecido em vinil...

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  12. Quem sabe o título de um pequeno livro do Daniel Filipe, de crónicas sobre a cidade de Lisboa? Eu tinha-o, mas perdi-o e sou incapaz de me lembrar do título...

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  13. Eu tenho um livro de crónicas de Daniel Filipe da antiga colecção Forma cujo título é Discurso sobre a cidade. Nesse livro existem excelentes crónicas sobre Lisboa, mas também sobre o Porto e outras localidades. Não sei se será a esse que faz referência.

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  14. "Discurso sobre a Cidade"! É isso mesmo. Obrigada, Teresa!

    ALICE VIEIRA

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  15. Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

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  16. "Discurso sobre a Cidade"! É isso mesmo. Obrigada, Teresa!

    ALICE VIEIRA

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  17. "Discurso sobre a Cidade"! É isso mesmo. Obrigada, Teresa!

    ALICE VIEIRA

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  18. De nada, Alice. Aliás, já aqui deixei uns dois 'posts' sobre o referido livro, só que ainda não os encontrei para deixar a referência em comentário.

    Beijinhos

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  19. Adenda (antes de passar à correcção dos testes): lá consegui encontrar uma dessas crónicas de Daniel Filipe em tempos aqui 'postada', esta parece ser (opinião pessoal) particularmente interessante:

    http://diasquevoam.blogspot.com/2009/03/quem-escreveu.html

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