22 de janeiro de 2009

SÍTIOS POR ONDE ELE ANDOU

Image Hosted by ImageShack.us

Uma velha canção ouvida na infância falava de alguém que não sabia o que tinha em Évora mas que de Évora sempre se estava lembrando. Pegando um pouco nisso, de Sintra se está sempre a lembrar e, ao contrário da canção, sabe o que lá tem.
Só quem um dia andou por Sintra em dias outonais, folhas secas pelo chão comido “travesseiros” na “Periquita”, uma garrafa de “Beira-Mar”, estupidamente gelada, (“um vinho fresco, esperto, seivoso, e tendo mais alma, que muito poema ou livro santo” ,Eça de Queiroz, “A Cidade e as Serras”), “A Casa do Preto”, verde, muito verde, cheiros, de flores de que não sabe o nome, passeado por Colares, Azenhas do Mar, Praia da Aguda, Almoçageme, Praia da Adraga, aquela rocha em arco onde o João César Monteiro, em “As Bodas de Deus”, está a comer uma romã a meias com a sensual Rita Durão, percebe melhor o encantamento, a volúpia de Sintra e o que à volta se espalha. Ainda um final de tarde no meio do nevoeiro cerrado do Cabo Da Roca, um gin bebido no Bar D. Quixote”, a chuva a lamber os vidros das largas janelas, o Atlântico a bater ao fundo.
Um bocado de um poema de Álvaro de Campos:


“Ao volante do Chevrolet pela estrada de Sintra
ao luar e ao sonho, na estrada deserta,
sozinho guio, guio quase devagar, e um pouco
me parece, ou me forço um pouco para que me pareça,
que siga por outra estrada, por outro sonho, por outro mundo,
que sigo sem haver Lisboa deixada ou Sintra a que ir ter,
que sigo, e que mais haverá em seguir senão não parar mas seguir?
Vou passar a noite a Sintra por não poder passá-la em Lisboa,
mas quando chegar a Sintra, terei pena de não ter ficado em Lisboa.
sempre esta inquietação sem propósito, sem nexo, sem consequência,
sempre, sempre, sempre,
esta angústia excessiva do espírito por coisa nenhuma,
na estrada de Sintra, ou na estrada do sonho, ou na estrada da vida…”

ou aquela variante que Ruy Belo desencantou:

“É Verão. Vou pela estrada de Sintra
por sinal pouco misteriosa à luz do dia
ao volante de um carro que não é um Chevrolet
e nesse ponto apenas se perdeu a profecia
não há luar nem sou um pálido poeta
que finja fingir a sua mais profunda emoção
chove uma chuva que me molha os olhos
e me leva a sentir saudades do Inverno:
a luz o cheiro a intimidade o fogo
Quem me dera o Inverno. Talvez lá faça sol
E eu sinta aflitivas saudades do Verão:
Uma estação na outra é a autêntica estação.”

Sim, Ruy Belo, aflitivas saudades… de quem sabe o que tem em Sintra e em tudo à volta… e de Sintra se está sempre lembrando...

Image Hosted by ImageShack.us

2 comentários:

  1. ....humm, agora sim, estamos a falar de coisas boas...

    JA

    ResponderEliminar
  2. Lindas e "doces" memórias as deste post! Quanto à parte dos doces, felizmente ainda são presente (bem como o Beira-Mar):)

    ResponderEliminar