27 de dezembro de 2008
NATAL ESTRAGADO
Ainda ontem aqui referia que teria alguma dificuldade em entender o Natal sem frio. Lembrou-se, então, que Eça de Queiroz se lamentava, nas suas “Cartas de Inglaterra,
que um Natal em Inglaterra não tinha sido Natal. Pela simples razão de não ter caído neve:
“O Natal, a grande festa doméstica da Inglaterra, foi este ano triste – dessa tristeza particular que oferece, por um dia de calma ardente, a praça deserta de uma vila pobre, ou dessa melancolia que infundem umas poucas de cadeiras vazias em torno de um fogão apagado, numa sala a que se não voltará mais…
O que nos estragou o Natal, não foram decerto as preocupações políticas, apesar da negrura de borrasca(…) nem a situação da Irlanda, que já não é governada pela Inglaterra, mas pelo comité revolucionário da Liga Agrária – seriam inquietações suficientes para tirar o sabor tradicional ao “plum-pudding do Natal. As desgraças públicas nunca impedem que os cidadãos jantem com apetite; e misérias da pátria (…)
Não; o que estragou o Natal, foi simplesmente a falta de neve. Um Natal como este que passámos, com um sol de uma palidez de convalescente (…) um Natal sem neve, um Natal sem casacos de peles, parece tão insípido e tão desconsolado como seria em Portugal a noite de S. João, noite de fogueiras e descantes, se houvesse no chão três palmos de neve e caísse por cima o granizo até de madrugada! Um desapontamento nacional!”
Permitam-lhe mais uma citação desta carta:
“O filósofos afirmam que isto há-de ser sempre assim: o mais nobre de entre eles, Jesus, cujo nascimento estamos exactamente celebrando, ameaçou-nos, numa palavra imortal, que “teríamos sempre pobres entre nós”. Tem-se procurado com revoluções sucessivas fazer falhar esta sinistra profecia – mas as revoluções passam e os pobres ficam.”
Diga-se que estas cartas, sem estarem datadas, foram escritas durante a permanência de Eça de Queiroz em Bristol, de Setembro de 1980 e Outubro de 1882, e constituíram a sua colaboração para a “Gazeta de Notícias” do Rio de Janeiro.
O frio já traz um cheirinho a Natal. Os que passei na praia em ambiente tropical (latitudes experimentadas por obrigação, não por lazer) não me deram contentamento... mas é certo que pelo menos a chuva faz parte do nosso imaginário natalício:)
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