21 de abril de 2006

Mordidelas metalóides

O Carlos apresenta uma série de procupações relacionadas com a amálgama dentária. Comentários:

  • A amálgama dos dentistas constituíu um avanço técnico precioso, permitindo conservar a dentição e a mastigação a um número incontável de pessoas.

  • Posteriormente surgiram novos métodos de preenchimento dentário: mais leves, mais moldáveis, esteticamente mais interessantes e, por definição, mais dispendiosos.

Entretanto confirmou-se a toxicidade do mercúrio – mas nunca de forma clara no tocante à amálgama. Contudo, muitos se apressaram a tocar os clarins do risco das amálgamas dentárias. Podemos imaginar várias motivações, algumas das quais, se calhar, menos nobres – denegrir a amálgama leva a uma mudança para os restantes produtos, não é?

Dito isto, convém ter presente um conjunto de conceitos antes de se saltar para conclusões:

  • O facto de uma substância ser nociva em determinadas circunstâncias não implica automaticamente que seja nociva em todas as circunstâncias.

  • A demonstração de uma relação de causalidade em biomedicina é habitualmente difícil – excepto quando o efeito é de tal modo claro que se torna evidente.

  • Muitos efeitos alegadamente atribuídos a determinada causa não têm qualquer relação com essa causa, podendo ter origens diversas. Isto é particularmente relevante quando esses efeitos caem na classificação dos sintomas e sinais mal definidos – mal estar geral, cansaço, dores de cabeça difusas, diminuição da memória auto reportada, etc.

Portanto, confesso não estar rigorosamente nada preocupado com o problema da amálgama dentária. É, ou foi, um método excelente para preenchimento de cavidades e reconstrução de dentes. Para além de um ligeiro aumento de incidência de doença parodôntica (gengivites e afins), a toxicidade pelo mercúrio das amálgamas dentárias parece situar-se em níveis negligenciáveis. Se hoje ela pode ser abandonada não é por ser intrinsecamente má, mas porque, entretanto, se arranjou melhor. Chama-se a isto progresso, e não temos de nos envergonhar. Daqui a cinquenta anos haverá, provavelmente, um método holográfico de recontrução dentária a laser roxo assente em hidrogénio captado por placas solares, e a gente desses tempos olhará, enojada, para o primitivo início do século XXI, em que as desgraçadas pessoas tinham que usar horríveis resinas polimerizáveis, perigosíssimas (sabe Deus porquê), para tapar os buracos dos dentes...

Mas isto sou eu a falar, que tenho pelo menos nove dentes atascados de amálgama. Deve ser o mercúrio que me deixa neste estado.

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