23 de agosto de 2004

A primeira vez .

Era uma catraia de uns 12 ou 13 anos, não consigo precisar. Nessa altura éramos completamente marginalizados por uma pequena diferença etária, ou seja para um fulano de quinze anos nós éramos inexistentes.
Era uma altura em que ohávamos muito, sentíamos o coração aos pulos a indiciar "Ele está ali,Ele está ali". Adequava o meu horário no bar para O ver. E quando ouvia a voz Dele, até arrepios sentia. Analisando retrospectivamente, era um bonito rapaz. Olhos esverdeados ou acinzentados, alto, cabelo castanho claro e com um ar de quem está longe, muito longe do mundo. Um dia descobri que ele passava à frente de minha casa todos os dias e eu esticava o pescoço para o ver. Ficava de nariz esborrachado no vidro e a escrever coisas tolas no diário.
Verdade seja, que achava os miúdos da minha idade uns chatos. Tinha um ruivinho que me perseguia até à mercearia. E nunca disse uma palavra, nem sequer para ajudar a carregar as compras.
Mas o J, bem o J era O TAl. Devia ter 16 ou 17 anos e nunca me passou cartão.
Não o vi durante muitos anos, até que um dia em que fui a Leiria, tinha eu uns 38 anos sentei-me numa das esplanadas da Praça Rodrigues Lobo.
Senti-me olhada e correspondi. Era ele. Vagamente sabia quese tinha tornado arquitecto e que tinha um problema de alcoolismo. Reconheci-o mais pelos olhos, que continuam a ter a mesma expressão e ele fez-me um vago sorriso de reconhecimento .
Acho que foi a primeira vez que deu por mim, aquela miúda chata que o mirava com ar adorador e em quem ele tropeçava por todo o lado.
Ou será que sempre soube? Acho que nunca o vou saber. Mas acho que às vezes ainda sonho com ele.

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