12 de abril de 2004

Publicidade (1)

Não vejo muita televisão, mas quando chego dos fins de semana passados em Viseu, é como se tivesse passado uma semana inteira a olhar o pequeno ecrã ininterruptamente. Há tão pouco para fazer na pequena vila de Santarinho que vi e revi todos os anúncios que passam nos canais 1 e 3 (sim, porque é tudo o que a televisão apanha).
Fez-me pensar o anúncio do novo Wolkswagen (é assim que escreve?) Tauron (é assim que se escreve?). Começa com um carro de família (nitidamente) que percorre a estrada escura de faróis acesos. É conduzido por um homem de meia idade que leva como passageira ao seu lado, uma jovem rapariga com ares de estar no final da sua adolescência, não tão fashion quanto poderia ser, mas definitivamente uma jovem rapariga. O homem pára o carro em frente de uma (bela) casa, a rapariga despede-se dele com um beijinho na face, sai do carro, fecha a porta, sobre alguns degraus e entra em casa. O plano muda para um close-up da uma janela de onde, de entre a cortina azul que afasta com a mão, espreita uma mulher. Há um diálogo entre a mulher e a jovem rapariga que permitem perceber a relação que há entre as três personagens que apareceram até aqui: O homem que conduzia o carro de família, a jovem rapariga não tão fashion quanto poderia ser, e a mulher que surge de entre as cortinas azuis que afasta com uma mão.

Mulher – Então o pai, está bom?
Jovem – Sim, muito bom.
Mulher – Está mais magro...
J – Sim...
M – Anda com alguém... de certeza!
J – Oh mãe...

E aqui vê-se o carro a sair pelo portão do jardim da (bela) casa.
Isto deixou-me a pensar, e porquê? Porque foi o primeiro anúncio que vi que foca tão nitidamente uma família que é já uma espécie de mutante do conceito de família tradicional que havia há uns anos atrás. O divórcio, as pequenas rivalidades entre progenitores, os pais de fim de semana, tudo isso é tão comum que agora até na publicidade aparece sem qualquer problema e sem qualquer choque. Não é mais violenta a ideia de ter os pais separados, não é mais uma vergonha que a família esteja assim... despedaçada (não sei se não será uma palavra certeira). E não há mais um apego ao conceito de família completa – mãe pai avós e quantos filhos houvessem – o que resulta na aceitação natural do desaparecimento desse conceito e do esforço para que este se mantenha.

Mas quem sou eu para falar de família.
Venham, pedras?

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