11 de abril de 2004

A Ponte grande de um país pequeno

Ontem, cerca das sete e meia da tarde, atravessei a Ponte sobre o Tejo. A que tem nome de data e antes tinha nome de ditador. Demorei um tempo insano a passá-la. Vinha da Caparica. Demorei não porque a massa de veraneantes habitual estivesse a regressar da praia, visto que estava algo fresco, mas porque alguns dos iluminados que velam pelos destinos da Nação resolveram fechar a ponte ao tráfego para que um barco destinado a turismo de luxo pudesse passar por baixo. “Por questões de segurança”, referiram os órgãos de comunicação. Eu tinha ouvido dizer na rádio que a Ponte estaria encerrada cerca de meia hora por volta das cinco e meia da tarde. Quando atravessei estava encerrada a faixa da direita. Não vi sinais de acidente ou de qualquer problema. Apenas um reboque (e um carro da polícia?) em cima da Ponte, na dita faixa. Atrás de mim filas imensas, num ensaio antecipado do regresso de Domingo de Páscoa.

Triste país este que vive de cócoras perante os restantes, que fecha ou limita o trânsito de uma via essencial aos seus cidadãos por causa das exigências de uma companhia de navegação (ou de quem quer que fosse que exigiu ou decidiu, é-me indiferente) para que o seu brinquedo novo pudesse atracar na Rocha do Conde de Óbidos sem o risco de alguém atirar alguma coisa da Ponte para cima deles. Alternativamente, se alguém achava que o navio constituía um risco para a Ponte e para os seus utilizadores, a resposta era simples: não entrava no Porto de Lisboa. Porque carga de água entrou, então? Para que os turistas pudessem disfrutar da very Portuguese, very typical Lisbon, além de mais alguns souvenirs made in China e de umas vistas dos Jerónimos? Isto à custa do bem estar de alguns milhares de cidadãos portugueses? A Al-Qaeda não precisa de fazer atentados em Portugal – nós mesmos nos encarregamos de assassinar colectivamente o nosso amor próprio.

Sinto vergonha de ter um passaporte com a mesma nacionalidade dos responsáveis por esta decisão.

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