24 de abril de 2004

Experiência Insólita

Um desconhecido sentou-se à minha frente e perguntou-me quem eu era. Disse-lhe que eu era um extraterrestre. Perguntou-me o que estava a fazer. Disse-lhe que estava a enviar uma mensagem. Ele ficou perplexo. Expliquei-lhe que o meu telemóvel enviava mensagens. Ele ficou muito perplexo. Então tomei a iniciativa de fazer eu as perguntas. Perguntei-lhe se sabia falar português. Disse que não. Perguntei-lhe se sabia falar inglês. Disse que sim. Então, em rápidos instantes, tomei a determinante decisão de continuar o diálogo em português. Quando ele acabava de se recompôr da sua perplexidade, eis que era chamado. Afastou-se.

Passados momentos regressou. Perguntou-me onde estava o meu telemóvel. Eu apontei-lhe a carteira dos documentos. Ele abriu-a, inspeccionou-a e chegou à conclusão de que não estava lá dentro. Ao lado da carteira estava um invólucro preto com formato de telemóvel. Perguntou-me de novo onde estava o telemóvel. Eu apontei-lhe o invólucro. Ele desconfiou. Então, com um gesto, daqueles gestos universais que apelam aos instintos comunicativos transversais a todas as espécies da galáxia, incitei-o a abrir o invólucro, também conhecido por "bolsa".

O telemóvel, brilhante, magnético, enigmático, pesou-lhe nas mãos, transmitindo-lhe intimamente uma estranha e inefável miríade de desejos desconexos e em turbilhão. Perguntei-lhe se ele mesmo era possuidor de algum. Respondeu-me que não. Então revelei-lhe um facto secreto e sagrado, imanente ao pulsar das estrelas, comunicante com o suave frémito das ondas extra-cósmicas: eu tinha recebido a elevada missão de possuir um telemóvel aos 3 anos de idade. O desconhecido, retribuindo a confiança que generosamente eu manifestara, declarou por sua vez o fascinante histórico da sua missão: havia completado já 5 anos de idade mas ainda não tinha recebido um telemóvel.

Pousei solenemente a minha mão direita por sobre o seu ombro. Penetrei o seu olhar atingindo-lhe o húmus do seu discernimento. Disse-lhe para comprar um telemóvel. Ele pestanejou, deglutindo avidamente o digno conselho provindo da minha voz. Concordou com os olhos e afastou-se para o eterno com a responsabilidade da sua nova missão.

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