27 de março de 2004

A voz que sobe ao Céu

Um céu de chumbo e água lá fora. A trabalhar no computador e a ouvir Nusrat Fateh Ali Khan. Não o ouvia há uns tempos. O choque e o arrepio são sempre iguais. Esta é daquela música que faz o ateu mais empedernido duvidar da sua certeza.

Um amigo meu ouviu-o, na Austrália. Eram quase duas da manhã, num festival de world music, contou-me ele. Nusrat era o último a actuar. Cantou até passar das quatro. O meu amigo refere estar estendido na relva, a olhar as estrelas e a escutar, juntamente com uns milhares de pessoas, num silêncio total em que só aquela voz e aquela música inacreditável soavam. Diz ele, músico amador e habitué sofisticado de palcos de todos os continentes, que este terá sido o maior momento musical da sua existência e uma das experiências mais transcendentes que terá vivido.

Nusrat Fateh deixou-nos há algum tempo. Está provavelmente a cantar algures. Abençoada época a nossa, que nos deu a gravação de som e nos permite guardar os maiores tesouros em suportes tão humildes e elementares.

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