25 de março de 2004

Comentário à crónica de hoje de Pacheco Pereira

Crónica de hoje de Pacheco Pereira no Público.

O meu comentário:

É preciso notar que a aplicação prática do catecismo de Nechaev não teve um objectivo niilista, antes pelo contrário: existiu sempre não um objectivo de destruir a sociedade e a economia mas sim um objectivo de alterá-las visando a melhoria das condições de vida de alguém, o bem de alguém (dos trabalhadores, dos proletários, dos “arianos”, etc.). Portanto, os objectivos não eram niilistas, de negação pura, mas sim objectivos revolucionários, de transformação. E, muito importante, essa aplicação prática tinha pendor ético: o bem para os trabalhadores, a justiça social. Tratou-se, no fundo, de um mau método ao serviço de um bom fim (para quem o defendia).

Também no caso da Al-Qaeda, o objectivo (pelo menos o mais explícito) não será o da destruição pela destruição mas sim a destruição como forma de punir aqueles que, na perspectiva fanática da Al-Qaeda, são considerados os bárbaros, os imperialistas. Percebendo a sua perspectiva, o fenómeno é o mesmo: o mau método ao serviço do bom fim.

É necessário ressalvar que tanto no caso dos comunistas como no dos nazis ou anarquistas, etc., como no caso da Al-Qaeda, o método do terrorismo não é visto como uma coisa má, antes pelo contrário: onde está o mal em enforcar o latifundiário??? qual o drama de queimar um judeu???? fazer explodir americanos e seus aliados, pecado????? Antes pelo contrário!

Já agora valerá a pena pensar que para lançar duas bombas atómicas sobre um mesmo país num espaço de três dias não convirá muito sentir grandes remorsos nem escrúpulos por esse acto. E só não se terá remorsos pela morte de alguém se não se reconhecer a esse alguém o mínimo da dignidade humana. E quem diz bombas atómicas diz bombas convencionais sobre os sérvios ou milhares de toneladas de explosivos diariamente sobre os iraquianos...

O objectivo não explícito da Al-Qaeda não precisará de grande filosofia para ser entendido: é a costumeira, a recorrente, a eterna e ubíqua vontade de poder pelo poder, o gozo de levar à prática esse poder através do exercício do seu modo mais absoluto: o de matar, o de matar muitos, o de matar muitos da forma mais cruél, o de matar muitos da forma mais cruél e inesperada e arbitrária.

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