6 de agosto de 2003

Livros, gibis, palavras enfim

Teresa, nunca li Enid Blyton, que nem sei quem é. Eu, em menino, lia coisas que hoje soarão talvez conservadoras: Andersen, Lewis Carroll, Esopo, os irmãos Grimm, Collodi, o Tesouro da Juventude, coisas assim. E lia também Stevenson, que, pensando bem, não é lá tão infantil.

Lia também, como você, muitos gibis. Adorava-os. Peanuts (que aqui se chamava Minduim), Pogo, a Mafalda, O Mago de Id, Dick Tracy, Tereré, Brucutu, muito Asterix, Príncipe Valente, X-9, Flash Gordon, Little Nemo, a turma do MAD (Al Jaffee, Don Martin, Sergio Aragonés), Terry e os Piratas, Tintin, Iznogud, Hagar o Horrível, Pafúncio e Marocas; e coisas que só havia aqui: a Mônica, o Fradim. Agora releio e vi que botei os nomes brasileiros de muitas personagens; talvez as conheças com outros nomes. Gibi, aliás, é como se chama popularmente aqui a revista de histórias em quadrinhos, ou banda desenhada - é que gibi é gíria antiga, que quer dizer "moleque preto" ou "negrinho", e justamente um negrinho, um gibi, era o símbolo da primeira revista que circulou com quadrinhos, no Rio dos anos trinta. Ler um Gibi comendo um "pé de moleque" (doce de amendoins torrados e caramelados) era o que havia de bom.

Continuando, Teresa do Coração Grande: há novos escritores no Brasil, muitos até. Mas a maioria anda tão crua, e é na verdade tão ruim, e deixa tanto a desejar, que só tenho coragem de recomendar três: Patrícia Mello, Acqua Toffana; Milton Hatoum, Dois Irmãos; e Luiz Ruffato, Eles Eram Muitos Cavalos.

Mas mais interessante que ler esses é ler os não tão novos, os velhos, e os francamente vetustos. É imprescindível que se leia Raduan Nassar, Lavoura Arcaica e Um Copo de Cólera; o que se puder pilhar da poesia de Hilda Hilst (a prosa é impenetrável); Dalton Trevisan e suas Novelas Nada Exemplares, ou os 111 Ais; tudo o que houver do Millôr Fernandes, do Rubem Braga e do Paulo Mendes Campos; a poesia do Murilo Mendes; Laços de Família, da Clarice Lispector (os romances são uns atoleiros; evite-os); O Coronel e o Lobisomem, do José Cândido de Carvalho; As Mentiras que os Homens Contam, do Luís Fernando Veríssimo; Angústia, do Graciliano Ramos... e paro por aqui, antes que me acusem de estar a soldo do Paes de Andrade para lhes empurrar literatura brasileira goela abaixo. Garanto que do bom Paes nunca recebi um vintém, nem mesmo um adeusinho (esse, confesso, pilhava com gosto).

Agora aproveita, Teresa, e faz aí um lobby pelos contemporâneos de Portugal. Porque aqui, já sabes, só chegam Saramago e Lobo Antunes (e não se pode botar seus livros lado a lado, que se mordem), alguma Agustina... e mais nada. Minto: há a Inês Pedrosa, de quem lançaram agorinha mesmo um livro chamado Fazes-me Falta, que ainda não li, porque espero teu veredito.

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